Denúncias de assédio moral aumentam 7 vezes em um ano em Uberlândia

Cindhi Belafonte Repórter | Correio de Uberlândia

Denúncias por assédio moral no trabalho aumentaram 600% de janeiro a maio de 2014 em relação ao mesmo período do ano passado, em Uberlândia. Os dados são da procuradoria local do Ministério Público Regional de Minas Gerais (MPT), que informa que nos cinco primeiros meses desse ano foram abertos 14 procedimentos, contra dois instaurados entre janeiro e maio de 2013. Nos últimos 11 anos, de maio de 2003 a maio de 2014, foram instaurados 118 processos no órgão. Segundo a assessoria de imprensa do MPT, a quantidade de procedimentos instaurados não reflete, necessariamente, todos os casos de assédio moral, porque há episódios que não chegam ao conhecimento das autoridades.

Para o procurador do Trabalho de Uberlândia, Paulo Veloso, o aumento do número de registros está relacionado à maior informação dos trabalhadores. “A elevação na quantidade de denúncias não significa que o número de ocorrências aumentou. É provável que ele continue em índices semelhantes, mas hoje o trabalhador está mais consciente de aspectos relacionados ao ambiente de trabalho, e se sente encorajado a denunciar”, disse.

Segundo ele, o assédio moral é toda conduta que represente a possibilidade de ferir a integridade do cidadão em seu ambiente de trabalho. “É uma conduta abusiva, que é capaz de ferir um indivíduo psíquica, emocional e moralmente. Ela pode ser praticada por pessoas que ocupem nível hierárquico diferente em relação à vítima, em geral que sejam superiores, ou ainda que tenham a mesma função e grau de hierarquia”, afirmou.

O procurador explica ainda que, por causa de sua característica velada, a comprovação do ato por parte do empregado é dificultada. “Por ser uma conduta sorrateira, a obtenção de provas do assédio moral é mais difícil, mas o ideal é que o funcionário que se sinta assediado tente se munir do máximo de documentos e testemunhas, para comprovar a natureza do ato.”

Para denunciar o assédio moral, o procedimento é relativamente simples. “Basta procurar o Ministério Público do Trabalho, ou mesmo o Ministério do Trabalho, e denunciar. Diante dos elementos, o órgão vai propor a ação a pessoa que praticou o ato”, disse.

A advogada especialista no tema, Viviane Martins Parreira, afirma que há grupos em que as ocorrências de assédio moral são mais comuns. “Mulheres, negros e deficientes são, em geral, alguns dos alvos dessa conduta. Profissionais de categorias que lidam com o público e trabalham sob pressão, como bancários, operadores de telemarketing, modelos, também são potenciais vítimas”, afirmou.

Segundo ela, o que caracteriza uma conduta como de assédio é a repetição. “É uma ação que acontece diversas vezes, até culminar no dano moral e, às vezes, físico e psicológico. Não há ainda uma legislação específica para criminalizar a conduta, então a punição acontece por analogia com outras leis.”

Condutas abusivas podem afetar a conduta do trabalhador, diz psicóloga

Os efeitos que um assédio moral pode provocar na vida de um trabalhador são devastadores. A afirmação é de uma das representantes do Conselho Regional de Psicologia (CRP) de Minas Gerais em Uberlândia, Aparecida Cruvinel. Ela afirma que a conduta abusiva por parte de empregadores ou colegas de trabalho pode agravar os níveis de adoecimento. “Pessoas vítimas desse tipo de agressão ficam, com o tempo, fragilizadas e, em geral, desenvolvem problemas de saúde de diversas naturezas, como doenças psicossomáticas, hipertensão, e dificuldades de cognição”, disse.

Segundo ela, há casos em que as vítimas não se dão conta de que a tristeza e o desconforto emocional que sentem são em decorrência de assédio. “Muitos às vezes não identificam a conduta como sendo de assédio. Começam a ficar tristes, fragilizados e vêm pedir ajuda. Aí é que conseguem ter a força para denunciar e romper com o ciclo de perturbação emocional.”

Ela afirma que é uma situação delicada para quem sofre os abusos morais, e por isso, há necessidade de amparo. “O trabalho é uma parte da identidade das pessoas. É o local onde passam a maior parte da vida, e se sentir humilhado nesse local gera transtornos sérios. Elas precisam de ajuda e apoio”, afirmou.

Funcionária pública denunciou maus tratos cometidos pelo supervisor

Quase dois anos depois de ser diariamente insultada e ofendida por seu superior, uma servidora pública de Uberlândia resolveu romper com o silêncio e tornar conhecidos os maus tratos que sofria em seu trabalho. “Não foi fácil tomar essa decisão, mas eu não me arrependo nenhum minuto seque de tê-lo denunciado”, disse a servidora, que prefere manter a identidade preservada.

Segundo ela, tudo começou porque ela se recusou a continuar trabalhando além da carga horária para a qual estava contratada. “Tenho que trabalhar oito horas diárias, mas por causa da sobrecarga de trabalho, chegava a trabalhar mais de dez horas por dia, além dos fins de semana. Um dia, disse ao meu superior que não podia continuar dessa forma, pois estava muito cansada. Ele não aceitou a recusa e ele começou a me perseguir”, afirmou.

Ela conta que, por causa dos efeitos do assédio moral, engordou 30 kg em três meses e teve que fazer cirurgia de redução de estômago, além de tratamento psiquiátrico, psicológico e fisioterápico. “Ele me chamava de gorda, fedida, falava que eu era incompetente. Chegou a armar uma situação para tentar me prender por desobediência, mas felizmente não conseguiu”, disse. O assédio moral sofrido por ela no trabalho afetou também a vida de seus familiares. “Minha filha teve que começar a fazer terapia, porque a situação emocional de toda a família foi abalada”, disse.

Depois da denúncia, ela foi transferida de setor e reduziu sua carga horária para meio período, para conseguir dar continuidade aos tratamentos de saúde.

Denúncias de assédio sexual também aumentaram em Uberlândia

Outra conduta igualmente nociva e que, segundo o procurador do Ministério Público do Trabalho em Uberlândia, Paulo Veloso, acontece com alguma frequência no ambiente de trabalho é o assédio sexual. “Ele consiste em conduta abusiva que afronta a liberdade sexual da vítima, que geralmente é subordinada ao praticante da ação, e, muitas vezes, é acompanhada por chantagem”, afirmou. Segundo ele, nesse tipo de conduta há ameaça ou imposições por parte dos superiores, e que envolvem aspectos sexuais. “Assim como no assédio moral, o que caracteriza a conduta é a intenção de quem a pratica, independentemente se a vítima percebeu ou se sentiu assediada e intimidada com a ação”, disse.

De acordo com dados do MPT de Uberlândia, nos primeiros cinco meses desse ano, foram registradas três denúncias, enquanto que em todo o ano de 2013, apenas dois procedimentos foram instaurados. De maio de 2003 a maio deste ano, foram registradas 20 ocorrências desta natureza na cidade. “O assédio sexual é distinto do assédio moral e, por representar constrangimento maior da vítima ante a sociedade, a iniciativa para denunciar ocorre com menos frequência”, disse.

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